Após o colapso global, quando as antigas estruturas sociais ruem sob o peso de seus próprios excessos, sete mentes se reúnem para uma missão extraordinária: reinventar a vida na Terra. É neste contexto visceral que Biotecnosfera: uma experiência de sociedade, publicação independente lançada em dezembro, convida o leitor a participar de um debate ideológico eletrizante que transcende os limites tradicionais da ficção especulativa.
O escritor Lucas Araújo trouxe para a narrativa uma perspectiva única forjada na interação contínua com inteligências artificiais, mas este não é um livro que prega futurismo vazio ou soluções tecnológicas simplistas.

No centro da trama está Noah, um homem inquieto, ferido e lúcido, convocado para integrar este conselho extraordinário. Diante dele emerge um dilema existencial tão pertinente quanto perturbador: é possível criar um novo mundo sem antes encarar as próprias ruínas que o compõem? Os sete conselheiros debatem seis pilares fundamentais para esta reconstrução: Governança, Economia, Clima, Saúde, Segurança e Educação, transformando o espaço do conselho em uma arena filosófica onde ideologias colidem e reflexões sobre o futuro ganham corpo tangível.
Araújo constrói aquilo que denomina como um “laboratório vivo de futuro”, em que conceitos como economia regenerativa, educação simbiótica e uma Carta Algorítmica Comum (uma forma de governança ética de inteligência artificial) não funcionam como meros artifícios futuristas, mas como expressões orgânicas de um modo de existir que busca alinhar a coexistência entre humanos, tecnologia e natureza.
O que distingue Biotecnosfera no panorama da ficção contemporânea brasileira é sua estrutura experimental. Trata-se de uma metanarrativa, onde o próprio formato do livro se torna parte da mensagem. O leitor não é um observador passivo, mas um participante ativo nesta assembleia visionária. Ao final da leitura, descobre-se que a obra é a forma como ela é estruturada, criando uma camada adicional de significado.

Os debates do conselho gravitam em torno de questões urgentes e reais: colapso climático, governança política, saúde mental e pertencimento. Araújo utiliza essas questões não como pano de fundo decorativo, mas como ferramentas narrativas para oferecer uma experiência literária que dialoga profundamente com os desafios contemporâneos enfrentados pela sociedade. E há um grande plot twist aguardando o leitor ao final.
Para além das páginas, o projeto Biotecnosfera se estende através do site https://biotecnosfera.com/index.html, que oferece ao público acesso a simulações, projetos detalhados e visões para uma sociedade regenerativa. É uma proposta transmídia que reconhece a urgência de explorar novos modelos civilizacionais não apenas na ficção, mas em diálogos estruturados e pensados.
Biotecnosfera não é meramente ficção especulativa. É meditação, ensaio e rito. Um convite para transformar o olhar sobre o planeta, sentir sua respiração, reconhecer tanto a beleza quanto a ferida que constituem nossa sociedade atual. É um lembrete de que a regeneração não é uma escolha, mas uma necessidade profunda e coletiva.
Para quem busca ficção que desafie o pensamento, que dialogue com inteligências artificiais como ferramenta criativa legítima, e que questione os modelos civilizacionais atuais, Biotecnosfera oferece uma leitura que ressoa tanto no intelecto quanto na experiência sensorial. Uma obra para tempos de transição, escrita por alguém que compreende que a verdadeira regeneração exige confronto, compaixão e imaginação radical.