Mafia: The Old Country nos coloca em uma viagem cinematográfica a uma Sicília sombria do início do século XX. Pela primeira vez, a icônica franquia centrada no submundo do crime italiano se expande para fora dos Estados Unidos, buscando contar uma história de origem que certamente agrega muito valor à série.
Para aqueles que não gostaram muito da abordagem de Mafia 3, que tentou inserir a franquia no padrão mundo aberto, trago boas notícias: Old Country segue o mesmo formato dos dois primeiros. Esse é o famoso “Mafia raiz”, trazendo uma aventura linear com uma trama profundamente cinematográfica e ação de tirar o fôlego.
No coração da Itália
A narrativa é o ponto central do jogo — bem escrita, repleta de personagens memoráveis e reviravoltas que, clichês à parte, conseguem nos comover. A direção cinematográfica abraça o espírito do cinema clássico de máfia italiana, com enquadramentos precisos, ângulos de câmera carregados de tensão e performances vocais convincentes (inclusive com a possibilidade de jogar com o idioma em siciliano).

Neste jogo, assumimos o papel de Enzo Favara, um jovem abandonado pelo pai que se vê forçado a trabalhar em minas de enxofre para sobreviver. Após enfrentar um dos seus algozes, Enzo foge e acaba ganhando a proteção de Don Torrisi, chefe de um dos maiores clãs da Sicília. Pouco a pouco, ele prova seu valor como “soldado”, mas também se mete em uma vida muito mais perigosa que a das minas.
As paisagens sicilianas são um espetáculo à parte. Ruas de pedra, vinhedos iluminados pelo sol mediterrâneo e mansões decadentes compõem um cenário riquíssimo, que se beneficia do poder da Unreal Engine 5.
Efeitos de luz, sombras e materiais trazem tridimensionalidade quase tangível. Os carros de época, as casas de campo, os objetos cotidianos — tudo carrega autenticidade histórica e visual refinado. Definitivamente, é o Mafia mais bonito lançado até aqui!

Na jogabilidade, a combinação entre furtividade, tiroteios e perseguições (a pé, a cavalo e de carro) entrega variedade e um gostinho de cinema. O sistema de stealth é básico, mas satisfatório – apesar de grande parte disso se dar ao fato dos inimigos serem “cegos e surdos”. O arsenal também é limitado, mas traz uma variedade suficientemente satisfatória para dar bastante emoção às trocas de tiros.
A mecânica de tiro, embora clássica, se mostra mais fluida que em títulos anteriores, com um sistema de cobertura responsivo e armas autênticas ao período. Contudo, atirar pode ser um processo bem irritante, considerando que a mira é imprecisa propositalmente; somente com alguns upgrades torna-se possível atirar sem passar raiva.
Já os combates com faca trazem alguns dos momentos mais memoráveis do jogo — ameaçadores, coreografados e intensos. Toda boss fight envolve um “risca faca” e, apesar de ser quase sempre a mesma coisa, em nenhum momento esses confrontos pecam em imersão e profundidade.
Um breve passeio pela Sicília
Por outro lado, a experiência é curta, levando cerca 12 horas para completar a história. A estrutura é bem linear, com quase nenhum respiro para exploração – o que é uma pena, já que ainda temos um mundo aberto para explorar, assim como em Mafia 1 e 2. Os capítulos limitam o território que pode ser explorado e, no fim, cerca de 70% daquele mapa vira apenas enfeite. O mundo se sente mais como cenário para o roteiro do que como um ambiente vivo que convida a desvios.

Por algum motivo, os devs não liberaram o modo Free Roam logo de cara. No remake do Mafia 1, tínhamos a liberdade de explorar o mapa livremente para encontrar colecionáveis – que também estão presentes em peso em Old Country. Já foi confirmado que o modo será disponibilizado em breve por uma atualização gratuita, mas não há sentido em ter sido deixado para depois.
A diversidade de gameplay até existe, mas acaba cansando com o tempo — especialmente porque segue uma estrutura muito previsível. Você terá a certeza que todo trecho que exige furtividade será abalado por um tiroteio no final, seguindo o script da campanha. Dessa forma, há pouco espaços para surpresas no decorrer da história – mas ao menos o jogo é curto, então não chega a ser um problemão.
Enquanto isso, a inteligência artificial dos inimigos é comportada, sem reatividade profunda, tornando encontros menos desafiadores do que poderiam ser. Em alguns cenários mais densos, também pode-se notar queda de performance, pop-ins visuais e instabilidades – detalhes que prejudicam um pouco as belas paisagens de San Celeste.

Mafia: The Old Country entrega uma experiência pura, autoral e visualmente sedutora, abrindo uma nova página mais pessoal e enxuta na saga Mafia. Os fãs dos jogos mais antigos da série certamente não verão defeitos nessa estrutura, mesmo com duração limitada e gameplay que não reinventa a roda.
Sua força está na delicadeza das interpretações, na beleza do mundo e na familiaridade respeitosa com os melhores momentos da série – inclusive ao vermos alguns personagens icônicos da trilogia em versões mais jovens. Já o final deixa uma bela porta de entrada para o aguardado Mafia 4, levando a diferentes teorias que certamente vão enriquecer o próximo título principal desta franquia icônica.
