Spencer – Crítica

Spencer é definitivamente uma obra prima encantadora e absurda, mas divide opiniões de quem o aprecia. Ou você ama ou odeia. Não existe um meio termo para defini-la – que na minha humilde opinião – é fantástica e preciosa em todas as suas camadas. Apesar de não ser uma produção popular, na verdade, o longa possui uma fórmula bastante simples, já que se trata de um momento bastante específico na vida de um personagem histórico.

Em Spencer, o casamento da princesa Diana Spencer (Kristen Stewart) e do príncipe Charles (Jack Farthing) esfriou há muito tempo. Embora os rumores de casos extraconjugais e um divórcio sejam abundantes, a “paz” é ordenada para as festividades de Natal, em um fatídico final de semana com a família real. Mas Diana conhece bem o jogo e se molda de acordo, porém, as coisas serão mais dramáticas que de costume.

É aqui que a histeria e o caos psicológico se estreita ainda mais, uma vez que o filme é uma especulação do que poderia ter acontecido durante aqueles poucos dias turbulentos na vida da princesa, e os seguintes após o seu pedido oficial de divórcio com o príncipe Charles. Então os espectadores que esperam uma imagem tradicional (feliz) de Diana ficarão, na sua razão, desapontados

Ao invés de sintetizar a vida de Diana em duas horas de filme, o diretor Pablo Larrain é ousado e traz uma biografia corajosa e dedicada em captar a personalidade e estado de espírito da princesa nesse trágico momento. Larrain é justo e não se empenha em santificar Diana, muito menos demonizar a família real. Mas tudo está claro nos olhares e expressões da personagem que é interpretada brilhantemente por Kristen Stewart.

A atriz simplesmente parece ter nascido para representar esse papel e traz o espírito e a aparência da princesa Di de volta à vida real em uma performance assustadora. O maior mérito dela é conseguir desaparecer na personagem que é uma característica que Stewart sempre teve muita dificuldade em seus trabalhos.

Há uma elegância e profundidade profissional gigantesca de Kristen Stewart em trazer a densidade e expressões sutis de vulnerabilidade de Diana, que nenhum paparazzi nunca conseguiu captar antes. Por outro lado, Stewart capturou todos os seus tiques, padrões de fala e maneirismos, até a inclinação da cabeça de forma impecáveis.

A proposta de Pablo Larrain se torna ainda mais interessante porque o espectador é convidado a viver esse caos psicológico quase exclusivamente pelo ângulo de Diana; e o pico de desgaste que os dias de festas levaram-na a uma prisão de angústia e solidão.

Spencer é de fato um filme para ser apreciado em toda a sua totalidade. O clima de terror atmosférico deixa a obra ainda mais belíssima. Para onde olha, Diana está cercada de neblina, arames farpados e cortinas fechadas. Ela está completamente perdida – como na cena inicial do filme – e permanece isolada em imagens absurdamente claustrofóbicas. O drama é intensificado com uma trilha sonora que insere e mergulha o espectador mais fundo nesse quadro frio, tenso e infeliz.

Spencer é um conceito intrigante, envolvente e pesado, que se preocupa em transmitir um momento que muitos não faziam ideia que existiu. É a história da princesa que não é resgatada pelo príncipe e muito menos tem um final feliz. Mas é a história de uma mulher amada pelo povo, que não se preocupou com as regras e lutou até o fim, como pôde, para ser quem de fato era.

Ao invés de promover embates monárquicos enfadonhos e já conhecidos, o diretor Pablo Larrain vai além e traz um estudo de uma personagem ambientada num passado imaginativo. Do outro lado, temos Kristen Stewart, que saiu do limbo de uma escolha improvável, contudo, tão engenhosa para o papel, que outra atriz teria interpretado a coisa toda como exagerada demais.